Sistema digital de roteirização das vendas: quais são os riscos?

Atualmente, muitas empresas vêm desenvolvendo aplicativos e sistemas informatizados de controle e gestão de vendas que geralmente são disponibilizados em tablets, computadores e celulares.

A questão diz respeito à possibilidade legal e às cautelas que devem ser adotadas, com o objetivo de mitigar os riscos e as consequências jurídicas contrárias aos interesses da empresa na utilização das ferramentas tecnológicas sem desvirtuar as naturezas contratuais e a autonomia dos vendedores externos.

A empresa pode definir um roteiro de visitas aos responsáveis pelas vendas, mas o rastreamento e o acompanhamento da rota via sistema de satélite descaracteriza a natureza externa de sua atividade, pois, neste caso, o vendedor fica suscetível à ingerência do empregador, ao controle de jornada e adquire o direito ao pagamento de horas extras.

Este foi o entendimento do Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho da 7ª Turma do TST:

“RECURSO DE REVISTA – VENDEDOR – HORAS EXTRAORDINÁRIAS – ATIVIDADES EXTERNAS – EXISTÊNCIA DE MEIOS DE CONTROLE DE JORNADA. Para o enquadramento do empregado como trabalhador externo inserido nas disposições do art. 62, I, da CLT, é conditio sine qua non que o empregado exerça atividades fora do estabelecimento comercial da empresa e que não exista nenhum controle de horário, direto ou indireto. Anote-se que não é a ausência de controle de jornada que caracteriza a exceção do art. 62, I, da CLT, mas a impossibilidade desse controle, hipótese que não ocorreu no caso vertente; ao contrário, o Tribunal Regional consignou expressamente que o reclamante se submetia ao cumprimento da rota estabelecida pela reclamada, que os veículos estavam equipados com GPS/rastreador e a existência de monitoramento tanto por GPS/rastreador quanto por celular corporativo. Dessa forma, a submissão de rotas preestabelecidas pela reclamada e a utilização dos aludidos recursos tecnológicos afastam a exceção prevista no art. 62, I, da CLT, pois são meios que possibilitam a fiscalização da jornada de trabalho externo. Logo, afigura-se devido ao pagamento das horas extraordinárias. Recurso de revista conhecido e provido.” (RR – 1025-31.2014.5.06.0013, Relator: Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 7.ª Turma, Publicação: DEJT 13/04/2018).

Os riscos do sistema digital de roteirização e gestão de vendas disponibilizado aos vendedores envolvem a descaracterização do trabalho externo previsto no artigo 62 da CLT e, consequentemente, à sujeição e ao cumprimento de uma jornada de trabalho de oito horas diárias e 44 semanais, além de intervalo intrajornada, com pagamento de eventuais horas extras, quando prestadas.

Conclui-se, então, que o empresário deve ter muita cautela, primeiro, para que o sistema de rotas seja utilizado apenas e exclusivamente para a otimização das vendas e, depois, para que as rotas não sejam rastreadas para fins de fiscalização, pois esta medida pode ser entendida como meio alternativo de controle de jornada.

Mariana Panício Guimarães – OAB/SP 307.384