Empregado que perde ação com pedido de rescisão indireta pode ter seu contrato de trabalho mantido

Como sabido, o art. 483 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) expõe as hipóteses em que o empregado pode considerar rescindido o contrato de trabalho por “culpa” do empregador, a famosa rescisão indireta ou justa causa do empregador.

Deste modo, comprovada pelo trabalhador a existência de qualquer situação enquadrada neste artigo, como a ausência de cumprimento das obrigações do contrato pelo empregador (alínea ‘d’), o contrato será considerado rescindido como se tratasse de uma rescisão sem justa causa, com o pagamento de todas as verbas rescisórias pertinentes.

No entanto, o que ocorre caso o empregado se mantenha no trabalho após o ajuizamento da ação com pedido de rescisão indireta e esta medida judicial não lhe seja favorável?

Conforme decisão recentemente proferida pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), nos autos do processo ARR – 20379-14.2015.5.04.0029, o que temos é que o contrato de trabalho é mantido em sua íntegra, nos termos de trecho da ementa que segue:

(…) RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. MODALIDADE DE RESCISÃO CONTRATUAL. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA RESCISÃO INDIRETA JULGADO IMPROCEDENTE. EMPREGADO QUE PERMANECE EM SERVIÇO COM O AJUIZAMENTO DA DEMANDA. O art. 483, §3.º da CLT, autoriza o empregado a continuar trabalhando quando propõe reclamação trabalhista com base nas suas alíneas “d” e “g”. O dispositivo garante que, se malsucedido na tentativa de provar que o empregador cometeu justa causa, o empregado tem preservado o seu vínculo laboral. A interpretação de que a improcedência do pedido de reconhecimento da rescisão indireta implica pedido de demissão é incongruente com a própria norma que autoriza o reclamante a continuar trabalhando. O art. 483, § 3.º da CLT, autoriza que o empregado permaneça no serviço. Não é uma imposição. Assim, se houvesse interesse do reclamante de resilir o contrato sponte sua, o pedido de demissão seria realizado antes mesmo do ajuizamento da reclamação trabalhista. Portanto, a norma, ao garantir a permanência no serviço, não impede a continuidade do contrato após ser julgado improcedente o pedido de rescisão indireta. O contrato de trabalho é, em regra, contrato por tempo indeterminado, ungido pelo princípio da continuidade (o qual conspira em proveito da preservação dos vínculos de emprego), característica não afastada com o pedido de rescisão indireta. Ademais, na contestação, a reclamada não pleiteia a declaração de rescisão do contrato de trabalho a pedido do empregado, apenas sustenta a improcedência do pedido, o que configura preclusão. Assim, a decisão do Regional é inovatória e sem amparo fático, porque não houve pedido de demissão, além de estar em desarmonia com o princípio da continuidade. Recurso de revista conhecido e provido. (…) (TST, Processo: ARR – 20379-14.2015.5.04.0029 – Data de Julgamento: 11/04/2018 – Redator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, 6.ª Turma – Data de Publicação: DEJT 27/04/2018) (grifos nossos)

Em resumo, então, neste caso, o empregado pleiteou a rescisão indireta, obteve êxito em 1.ª instância, mas a decisão foi reformada em 2.ª instância, inclusive com a conversão da rescisão indireta em pedido de demissão. Recorrendo ao TST, embora mantida a não concessão da justa causa do empregador, houve o entendimento, nos termos acima mencionados, de que este fato, por si só, não pode determinar a rescisão contratual por pedido de demissão, mantendo-se intacto o contrato de trabalho.

Muito embora a decisão proferida pela Corte Superior Trabalhista esteja fundamentada, dentre outros, na CLT e no fato de que a empresa, na contestação, não fez pedido de conversão da rescisão indireta em pedido de demissão, algumas questões de cunho prático se mantêm.

Isto porque a lealdade contratual inerente a qualquer contrato, inclusive e principalmente nos contratos de emprego, certamente restou violada, senão vejamos. O empregado necessariamente embasou seu pedido de rescisão contratual por culpa do empregador em fatos que, segundo seu entendimento, teriam condições de configurar pelo menos uma das hipóteses do art. 483 da CLT.

No entanto, a improcedência do pedido, por óbvio, demonstra que não conseguiu comprovar qualquer destes fatos; além disto, a empresa teve que contratar advogados e arcar com custas processuais durante todo o trâmite, custos que não lhe serão ressarcidos em momento algum.

Como ficará, então, a relação entre estas partes? Ainda que com previsão legal, é justo que a empresa tenha que manter ileso o contrato de trabalho de pessoa que, ao não provar suas alegações, acabou por faltar com a verdade sobre o ambiente de trabalho e o cumprimento de obrigações patronais?

Porque, diante desta decisão, caso este funcionário não cometa qualquer falta grave (art. 482 da CLT), a única possibilidade de rescisão do pacto laboral por decisão exclusiva do patrão é justamente a demissão sem justa causa, com o pagamento de todas as verbas rescisórias, ou seja, exatamente o objeto do pedido da ação julgada improcedente!

Devem, então, restarem atentas as empresas a todos os casos ajuizados com pedidos de rescisão indireta, uma vez que, se mantido este entendimento do TST, a vitória, a depender das circunstâncias, pode não ter o resultado esperado.

 

Mateus Itavo Reis

OAB/SP 305.470